
Enquanto todos pensavam que ela estava em mais uma das suas tantas viagens, ela acordava todas as manhãs no mesmo porto...
Antes de se levantar, olhava para o lado e o via despertar sempre com um sorriso nos lábios, os cabelos esvoaçados e um bom humor que para ela sempre soava como uma deliciosa novidade matinal.
Durante muitos dias ela aquietou-se ali sem que houvesse nada que desejasse mais para sua vida do que a tranquilidade e a segurança que aquele lar lhe oferecia.
Dia após dia sua vida se firmava mais e mais naquele lugar e sua alma cigana ia perdendo aquela ânsia que sempre lhe sobressaltava o peito.
No início, ela havia sido tomada pelo medo da solidão que sempre ocupa os corações inquietos e as vidas aparentemente cheias de pessoas como ela. Talvez esse medo tenha sido a causa de sua decisão por ficar. Mas havia uma força maior, que por mais que ela tentasse, não conseguia...desfazer a mala. Se sentia culpada, mas não conseguia.
Sempre que ele saia ela sentava-se na cama e seu olhar distante parava fixamente em tudo que lhe pertencia...algumas roupas que quase nunca usava, muitos perfumes sempre usados e algumas lembranças das quais nunca conseguia se desfazer; tudo minimamente desarrumado dentro da mala sempre pronta.
Esse caráter de provisoriedade em tudo na sua vida era sua marca registrada, mas naquela vez ela realmente estava disposta a abandonar seus caminhos e decisões sempre tão ciganos. Mas ele nunca acreditou verdadeiramente, e quando foi numa manhã de céu cinzento, vento gelado, com lágrimas nos olhos e tom fúnebre ela lhe disse que iria partir. Ela desejou que ele a impedisse de ir, como fizera tantas outras vezes, mas ele apenas se desculpou, a abraçou e com os olhos marejados deu-lhe as costas para que ela não o visse chorar.
Quando ela se foi sentiu seu peito sangrar, sua alma ficou pequena e toda a liberdade que sempre lhe foi primordial pareceu-lhe a mais triste das prisões.
Ela esqueceu-se que havia persuadido sua alma a acreditar que sua vida cigana havia chegado ao fim, e foi por isso que por muito tempo ela ficou inerte diante do mundo todo que se abria a sua frente, pois ela não sabia mais caminhar sozinha e principalmente, não sabia para onde ir...
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